sexta-feira, 7 de maio de 2010

6

Manhã de julho. Linda manhã de julho. O brilho do sol, rompendo as brumas matutinas, trouxe felizes recordações que não queria relembrar, para não cair no vazio, na solidão que sufocava a cada instante. Para que chorar mágoas, para que sentir saudades, se tudo se reduzia mesmo ao nada, ao fatalismo e a evolução? Se a vida continuava sendo destruída para que outros vivessem? Pensou: Somos parte de um passado que está morrendo todo dia, lentamente e, repetiu a mesma frase em voz alta!

Para Lapa dos dias áureos da República não havia mais esperanças. Inevitável que os velhos casarões barrocos descem lugar a novos arranha-céus e praças ornamentadas. A igreja da Lapa com sua torre semi-destruída, marca deixada por Floriano, com um tiro de canhão, por certo ficaria na história da Lapa, para sempre. Mas os velhos bares, cabarés, restaurantes, dance-days se renderiam ao tempo, e só estariam na memória e nas velhas fotos de revistas ou jornais. Para os habitantes da Lapa não havia mais esperança. Tudo estava morto ou quase morto, inclusive a Casa de Estudantes, velho espigão de quatro andares rasgando o céu.

- Já é madrugada e não consegue dormir. Isso não era novidade para ele. Alguns bares ainda estavam abertos e saiu para tomar um café. Logo viria a manhã com os primeiros raios do sol, novamente. Paulinho, o porteiro, dormia , roncava, no sofá da sala, coberto com um casaco de lã. Bateu a porta, levemente ...fechou o trinco. Viu pela primeira vez os edifícios da nova Lapa que se reestrutura, lentamente, enquanto a velha Lapa morria. E Chico Asa Baixa que diria dessa evolução que condenava a todos ao mesmo fim?

Naquela madrugada Chico Asa Baixa chegou na Casa bêbado. Queria transar com Marli Sujinha no sofá da sala. Paulinho , o porteiro, protestou. "Ia denunciar tudo à diretoria da Casa , se não fosse o primeiro a transar com ela". Paulinho trabalhava durnte o dia em outro edifício e, à noite, dormia na sala, vigiando a entrada dos estudantes. Só voltava para casa, no subúrbio de Deodoro, de quinze em quinze dias.

Ficou tudo combinado, ele seria o primeiro. Mas aconteceu um imprevisto: outros estudantes que regressavam da noitada, também queriam participar da orgia. Assim, sete fizeram uma fila, enquanto Marli Sujinha, como gata no cio, realizava seu mais precioso desejo: transar com a elite da Lapa, os estudantes.

Paulinho deitou sobre Marli, deu um grunhindo e com o corpo ainda trêmulo, correu para o banheiro para se lavar. Ganhou por isso o apelido de “homem galo”, o ligeirinho. Chico Asa Baixa foi o segundo, e assim a fila foi diminuindo. Mas só ele, dias depois, teve que tomar mais de cinco doses de Bezentacil, para curar uma gonorréia e várias "cristas-de-galo". O cheiro que emanava das entranhas de Marli Sujinha não esqueceria jamais. Parecia carne podre, em decomposição, misturado com um perfume doce,barato, que só de pensar, dava náuseas e arrepios.

No outro dia Marli Sujinha espalhou entre os mendigos que dormira com todos da casa. Olavo quando soube protestou.

-Comigo não, pois não gosto de “rachadas”.

Ele gostava mesmo era de festas “privês”, em casas de amigos ricos, formados como ele, e aonde só freqüentavam casais gays.

- Bicha de classe é assim, dizia. Não sai pegando “michês” por ai, afirmava, rebolando a bunda e dando uma “rabiçaca”.
Rolava muito wiske nessas festas, contava orgulhoso. Tudo era de luxo e o clima, era o mesmo dos cabarés da Praça Mauá, com a exitação da luz vermelha !

Nenhum comentário:

Postar um comentário